Chapter Text
Passou a noite em claro pensando em tudo o que havia acontecido, com a cabeça latejando e o corpo doendo de tanto chorar. Ele sentia cada centímetro de sua pele o incomodar, como se aquele corpo nem fosse realmente dele.
Nada era confortável, a cama, o sofá, o chão. Só o que sabia era o peso das palavras em sua cabeça. O coração apertava só de lembrar de tudo o que ouviu, de tudo o que foi obrigado a reviver, e sua mente se contorcia em palavras que o destruíam ainda mais.
Os próprios soluços o sufocavam e lhe tiravam o ar que seus pulmões custavam em puxar, seus olhos inchados e vermelhos continuavam a queimar pela quantidade de lágrimas que continuavam a se formar.
Às vezes, sua mente se calava e o acalmava por alguns minutos, apenas para trazer mais uma onda de culpa e arrependimento que o derrubava novamente.
Ali, delirando entre o sono e a consciência, não estava simplesmente jogado na cama a ponto de cair de volta ao chão. Seu corpo flutuava em campos verdes e iluminados por um forte sol que pairava acima de sua cabeça, e o cheiro de grama e flores voava com o vento fresco.
Sentia seus pés descalços na terra, um fino tecido descendo por seus ombros, e podia ouvir com clareza seu nome sendo chamado. Ao longe, todos os seus amigos aguardavam por ele, rindo e se divertindo sentados em uma toalha de piquenique no chão. Até mesmo Felix estava lá, desestabilizando seu coração com aquele belo sorriso.
Não podia impedir seu corpo de correr até eles, vendo Heeyon de costas para ele, mexendo no cabelo e parecendo rir. Tudo estava como deveria ser, ainda mais perfeito do que havia imaginado. E se aquilo fosse um sonho, não queria acordar.
Um sorriso incansável em seu rosto, uma felicidade que transbordava por todo seu corpo ao sentir a grama pinicar suas pernas ao correr. Era real, ele tinha certeza. Os sorrisos, os abraços de seus amigos e até as vozes eram idênticas, como uma memória vívida que nunca havia acontecido.
Mas Hyunjin não tardou em ser trazido de volta à realidade, acordado no susto e arrancado de seu sonho por três toques inconvenientes em sua porta. Foi inundado mais uma vez por uma forte vontade de chorar, mas conseguiu controlá-la e poupar seus olhos já exaustos.
Se sentou na cama com dificuldade, passando a mão em seu rosto e tentando processar as últimas horas, quando os três toques se repetiram.
— O que você quer? — Perguntou apático.
— Sou eu. Vim ver se você está bem.
A voz grossa de Felix fazia sua cabeça doer pela falta de sono, e Hyunjin mais do que nunca queria ficar sozinho.
— Estou ótimo, pode ir agora.
O Hwang ouviu um baque seco na porta, como se Felix tivesse batido a cabeça na madeira. Não deixou de se questionar o motivo do Lee estar ali, e se estivesse mais disposto, até brincaria com isso, mas todo seu corpo gritava por descanso.
Mas ele não tinha mais um ombro amigo para chorar, um Christopher para consolá-lo ou um Minho para ajudá-lo com conselhos brutos. E era tudo culpa dele, e por isso precisava ser forte e engolir seu choro, encarando todas as consequências — que tardaram a vir.
— Hyunjin… Posso entrar? Por… Por favor? — Felix pediu, com hesitação na última parte.
— A porta tá aberta. — Não sabia o porquê de não ter apenas mandado-o ir embora.
Felix abriu lentamente a porta, vendo o quarto bagunçado e escuro com as janelas fechadas, e a única iluminação que agora invadia o cômodo era a do corredor. Hyunjin — que mal teve forças para virar e encarar o loiro — estava sentado na cama de costas para ele.
Se aproximou a passos quietos e cautelosos, ainda se questionando se não era melhor apenas o deixar e voltar para seu quarto. Mas algo dentro de si o impedia de deixar o Hwang sozinho naquele momento.
Parou em silêncio na frente de Hyunjin e se abaixou para olhá-lo nos olhos. Viu o estado em que se encontrava, com os olhos inchados e irritados, o nariz escorrendo e sua pele perfeita maltratada por olheiras e marcas pela privação de sono. Uma pontada de dor correu pelo coração de Yonbok, que se compadeceu e tomou hesitante a mão do Hwang.
Todo o corpo de Hyunjin rejeitou o toque de Felix, mas ele não foi capaz de se afastar, sendo obrigado a se acostumar com a sensação quente de sua pele na dele.
— Eu sei que você provavelmente me odeia agora. Mas também sabe que eu fiz o que precisei fazer… — Seu tom de voz foi se amolecendo, junto com suas palavras. — Mas eu queria me desculpar…
— Você? — Retrucou num tom irônico e ferido.
— Sim, eu. Confesso que talvez possa ter pego pesado demais… Não sou de me importar com os sentimentos de ninguém, mas também nunca me envolvi assim com algum trabalho.
Hyunjin observou enquanto Felix falava, e pôde notar um brilho humano em seus olhos, uma ponta de culpa sincera em sua voz. E sentindo a maciez da mão do Lee na sua, percebeu que não conseguia odiá-lo.
Mesmo sendo torturado continuamente pelas palavras duras do outro, dominado pela pressão que colocava sobre si mesmo. Lembrava dos gritos de Felix, lembrava de cada minuto que passou depois daquilo, sufocando em seu próprio desespero, não sentia ódio.
Não conseguia odiá-lo, nem ao menos um pouco. Talvez a verdade fosse que nunca tenha verdadeiramente odiado Felix, nem mesmo nos primeiros dias. E vê-lo ali, aberto e pedindo desculpas, fazia Hyunjin se questionar se seria tão ruim voltar mesmo para casa.
— Não que eu me importe, continuo achando você insuportável — Brincou com um sorriso — Mas eu não deixo um trabalho por fazer… E talvez eu sentiria isso se eu fosse embora sem me redimir.
Hyunjin apertou a mão do Lee levemente, reunindo coragem para olhar em seus olhos e perguntar:
— Por que você veio?
— Eu já disse-
— Não, Felix.
Por trás dos olhos brilhantes e subitamente humanos do loiro, o Hwang conseguia ver algo a mais, e se fosse realmente para se conciliar com Felix, queria saber o motivo real. Imaginava que o Lee tivesse lutado contra diversos pensamentos e se torturado tanto quanto ele, antes de decidir ir até seu quarto.
E era óbvio o quanto Felix estava hesitando em responder.
— … Hyunjin… Você sabe que horas são?
— Não? Por que eu ia-
— São quase cinco horas da tarde — Felix cortou, vendo os olhos de Hyunjin se arregalaram — Você ficou o dia inteiro no quarto.
De fato, com as janelas fechadas e o rosto afundado em seu travesseiro úmido, era difícil assimilar quanto tempo havia se passado.
— A luz do seu quarto ficou acessa a noite toda. Eu te chamei umas duas vezes e você não respondia. Tive medo que alguma coisa tivesse acontecido.
— Hm. — Hyunjin ficou quieto por alguns instantes, suspirando e voltando a falar — Eu não te odeio, Felix. Tudo o que você disse ontem… Eu não posso negar que foram apenas verdades. É só que…
— Não precisa dizer. Só vim ver se estava vivo.
Se abrir depois de tanto tempo privado de interagir com qualquer pessoa, estava sendo mais complicado do que imaginava. Ainda mais com Felix, que mesmo segurando sua mão — e agora sentado ao seu lado —, e com aquele sentimento transmitido através de seu olhar, não amenizava sua expressão rígida e tom de voz frio. Provavelmente por costume.
Sabia que Felix estava tão desconfortável quanto ele.
— Não, é que… Desde que você e o Chan chegaram de surpresa, eu tentei mais ainda fugir de tudo, todas as lembranças deles e das coisas que me fizeram vir pra cá. Ele deve ter te contado alguma coisa sobre mim.
— Sim, ele disse que no começo você poderia parecer chato e dramático, mas que você era demais. E que eu ia acabar me encantando por você. — Terminou a frase com um nojo forçado na voz.
Hyunjin não pôde deixar de sorrir, recebendo em troca um revirar de olhos e um leve sorriso de Felix.
Sentados ali, na cama, naquele quarto mal iluminado pela luz do corredor, de mãos dadas e tons de voz tristes, Hyunjin e Felix nunca se sentiram tão próximos, quase íntimos. E era uma situação estranha para sentirem isso, mas não se importavam.
— Esse “no começo” tá demorando demais — Brincou, quase caindo da cama com o empurrão do Hwang, que tentava esconder um riso.
— Cala boca, Felix. Mas enfim… O Chan me conhece, e nós dois sabíamos que eu não conseguiria relutar por muito tempo… E que uma hora ou outra, eu não ia aguentar e iria voltar… Eu só não esperava por você…
— Olha, não sei o que te fez vir pra cá, e o que te fez parar de relutar. Mas se fizeram tudo isso, depois de todo esse tempo, apenas pra te levar de volta… Algum motivo deve ter.
— Chris parecia nervoso quando chegou aqui e saiu sem mim… E já está na hora de parar de fugir de tudo. Mas…
Hyunjin pareceu pensar por alguns segundos, virando-se bruscamente para Felix.
— Se eu voltar com você, isso significa que você vai voltar para a Austrália e eu nunca mais vou te ver na vida? — Perguntou sugestivo.
— Sim.
— Podemos ir agora? — Brincou.
— Vai se fuder.
Hyunjin era ótimo em esconder sua dor; ótimo em fazer qualquer um acreditar que já estava bem após apenas alguns minutos. Mas seu coração ainda apertava fortemente, e sua cabeça latejava tentando não chorar novamente.
Felix se levantou com uma expressão mais amena e soltou a mão de Hyunjin, parou novamente em frente a ele e o encarou.
— Nós vamos amanhã de manhã, tudo bem pra você, ou precisa de mais algum tempo? — A voz subitamente carinhosa de Felix surpreendeu o anfitrião.
— Não, amanhã está ótimo — Sorriu. — Eu dirijo!
O Hwang ia se despedir de Felix para começar a arrumar suas malas, quando teve a mente completamente limpa de qualquer pensamento ao ver o Lee se aproximar e colocar uma mão em seu rosto, mas seu corpo não se moveu, os músculos tensos.
Sentindo uma leve carícia em sua bochecha, ele não tirou os olhos assustados do loiro, que parecia calmo como nunca. Já ele estava com o coração pulando do peito, sem saber lidar com a proximidade.
— Não chore mais… Você é menos entediante quando está feliz.
Felix se afastou em silêncio e saiu do quarto, deixando um Hyunjin atônito para trás. Não sabia porque havia feito aquilo, mas imaginou que o Hwang não veria seu ato como algo estranho.
Apenas queria demonstrar que estava tentando se importar. Sentia seu coração mais quente em saber que tudo estava bem entre eles.
Afinal, não foi só Hyunjin que passou a noite em claro. Felix, inquieto e pensando nos próximos dias — e um pouco na briga — ficou andando em círculos em seu quarto, roendo as cutículas e a mente a milhão.
Em algum ponto da madrugada, ligou para Olivia para tentar esquecer um pouco todos seus problemas. E ouviu dela, palavras que de alguma maneira quebraram uma barreira sobre seus olhos que ele nem sabia que existia.
“Eu acho que você tem medo de ser feliz. O tempo vai passar de qualquer jeito, por que você torna tudo tão complicado? Esquece um pouco de Henry.”
[...]
Depois de boas horas merecidas de sono, Hyunjin estava novamente em seu quarto, que dessa vez parecia vazio, assim como da primeira vez que pisou naquela fazenda. Mas não trazia o mesmo sentimento de recomeço, a mesma sensação de liberdade que havia sentido 3 anos atrás.
O dia estava cinza, vazio como aquela casa, melancólico como um final de domingo. Suas malas encostadas num canto qualquer, contrastando com a luz morta que atravessava a janela naquela manhã.
Nem mesmo suas plantas pareciam vivas, e tudo tinha o mesmo tom monocromático e triste. Toda aquela apatia refletia os olhos sem brilho daquele homem, que finalmente havia entendido a situação em que se encontrava.
Em poucos minutos, teria que descer as escadas com todas aquelas malas, embalar as últimas coisas e dizer um adeus definitivo àqueles anos passados ali. Teria de encarar novamente todo o seu passado ao voltar para a mansão. Seria obrigado a dar explicações, ouvir sermões e viver com a constante desconfiança de seus próprios amigos.
Estava desolado com esse pensamento, o olhar de reprovação de Minho, a mágoa suprimida de Seungmin e o sentimento de abandono de Jeongin. Não estava pronto para nada daquilo. E sabia que fugir mais uma vez não adiantaria, sabendo que Felix não tardaria em achá-lo novamente.
“Está tudo bem… Vai ficar tudo bem… Tudo vai voltar ao normal e eu vou esquecer de tudo. Vou começar de novo.” Era o que tentava se convencer.
Não era de seu feitio pensar negativo e ficar se lamentando. Então, Hyunjin respirou fundo e pensou que poderia fazer um café da manhã em sua cozinha pela última vez, regar suas plantas e observar o horizonte.
Pelo menos uma última vez.
— Hyunjin~ Ah, você tá aí. — O Hwang deu de cara com Felix ao sair de seu quarto.
— Bom dia. Suas coisas estão prontas?
— Desde ontem.
— Então vamos lá pra baixo. — Sugeriu, indo até as escadas — Vou fazer alguma coisa pra gente comer antes de irmos.
Era nítido até para Yongbok que Hyunjin estava diferente, não tinha aquele mesmo brilho esperançoso dos outros dias, e a voz não carregava a mesma animação de antes. As coisas estavam mais entediantes do que o tolerável.
Na cozinha, onde o moreno costumava cantarolar e se mover de maneira exagerada e quase que numa dança, ele permaneceu quieto e de cabeça baixa, nem se importando com o silêncio.
Tudo estava ainda mais desagradável do que nos dias em que os dois juravam se odiar, discutindo sem motivo numa hostilidade quase infantil. A falta de qualquer emoção conseguia ser ainda pior.
— Você quer que eu pegue alguma coisa do andar de baixo para você levar? — Felix ofereceu, não querendo ser prestativo, mas sim arrumar algo para fazer.
— Na verdade sim. Tem uma plantinha com as pontas das folhas vermelhas, perto da televisão.
— Só isso?
— Acho que sim, as outras vão morrer de qualquer forma — Aceitou triste. — Mas essa é especial.
Hyunjin apontou na direção certa quando Felix se levantou da mesa, agarrando alguns potes na estante até encontrar o correto. Um pequeno pote de barro decorado com barbante trançado, carregando uma planta baixa enterrada numa terra escura.
Suas folhas destoavam entre si, carregando desde o caule um verde vivo e bem cuidado, se misturando com um vermelho que tomava cada vez mais a cor de sangue conforme chegava nas pontas. A folhagem coberta com pequenas pelagens, fazendo a planta parecer um veludo.
Era magnífica, desde seus brotos até as folhas antigas que começavam a amarelar, e o cuidado especial que Hyunjin tinha com aquela planta era nítido.
— Sempre amei qualquer planta. O Chan me deu essa pouco antes de eu ir embora.
— Eu ganho algum tipo de ponto extra se eu fingir que me importo? — Interrompeu.
O Hwang arregalou os olhos, mas lago começou a rir descontraído. Felix não entendeu, apenas estava sendo um cuzão, para ver se Hyunjin voltava ao normal, não era para ele estar rindo.
— Ai, Felix — Gargalhou com a mão na barriga — Pelo menos você continua o mesmo.
— Como assim?
— Depois de ontem, fiquei com medo de você do nada começar a ser legal. Eu ficaria triste se tivesse que me despedir logo quando você começasse a ser uma pessoa normal.
— Eu sou um doce. — Afirmou convencido.
— O doce preferido do diabo né? Só se for? — Hyunjin retrucou.
— Se eu não estivesse de mau-humor, eu seria completamente adorável pelo resto do dia, só pra calar a sua boca.
— Vou fingir que acredito, pedra babaca.
[...]
Quando a hora finalmente chegou, foi um sacrifício fazer Hyunjin parar de arrumar desculpas para não sair da casa. Às vezes dizia haver esquecido alguma coisa, às vezes inventava ter deixado de trancar alguma janela. Tudo para fugir do inevitável, atrasar o que ele sabia que aconteceria de qualquer maneira.
Felix teve que arrastá-lo para fora do quarto talvez duas vezes, e o flagrou novamente no andar de cima, trancando a porta do único cômodo que não havia visitado naquela casa. Apenas sabia que era ali onde o Hwang se escondia quando sumia por algumas horas.
E ao não ter mais para onde fugir, ou desculpas para dar, Hyunjin foi seguido de perto até o lado de fora, para que não voltasse mais uma vez. Com suas malas na mão, o vento frio e angustiante o atingiu com força.
Tudo parecia se agitar mais do que o normal naquela manhã, e nem mesmo o sol se sentia disposto a aparecer. A melancolia parecia se formar como uma grande nuvem de chuva, nublando seus pensamentos, tornando seu corpo frio, os dedos apertando seu próprio corpo.
O coração batia com força, e seus pulmões puxavam o ar violentamente enquanto Hyunjin tentava não chorar. Ainda sem a coragem para olhar para trás.
A porta da frente já estava trancada, não havia mais volta, aquele era o fim.
— Está pronto? — Felix perguntou.
— Não tenho muita escolha.
Sua voz saía trêmula, sua boca estava seca e seus olhos ardiam, ele não se sentia nem um pouco pronto, seja lá para o que fosse. Tudo o que queria era voltar para dentro de casa, e assistir alguma coisa no sofá, tomando um chá ou lendo um livro.
Os latidos de Kkami irritado dentro da caixinha de transporte faziam seus ouvidos doerem. E ele manteve seus olhos fechados por um bom tempo, tentando controlar e amenizar o aperto angustiante em seu peito.
Hyunjin engoliu em seco e olhou para trás, vendo a casa que se esforçou tanto para cuidar, parecer opaca e vazia, como se o expulsasse de lá.
Todo o peso da realidade o atingiu como uma onda, a mesma onda a atingir seus olhos com lágrimas incontroláveis, que não tardaram a se tornarem soluços.
Tudo pulsava de maneira dolorosa, sua visão era distorcida pela força que fazia sempre que piscava; os joelhos perderam a força e o Hwang cambaleou para trás, levando uma mão até sua boca para tentar silenciar os soluços que o dominavam.
Tudo o que havia vivido naquela casa, naquele lugar, toda a esperança e felicidade — por mais que falos e momentâneos — que a ideia de uma nova vida havia trazido a ele. Tudo, tudo. Tudo.
Tudo. Tudo havia chegado ao fim. Não da maneira que imaginava, não da maneira que havia sonhado após tantas noites inquietas.
Seus amigos não estavam lá, seu pai e sua irmã não estavam lá, num belo dia de sol para anunciar que toda aquela dor havia acabado e que ele poderia voltar para casa. Sua realidade era muito mais dura, cinza. Morta.
Tudo o que via era um céu tão triste quanto ele, toda a natureza sem cor, um latido agudo ao fundo de seus ouvidos e um australiano loiro insuportável que estava o obrigando a voltar para Gangnam.
Voltar a uma vida onde tudo se resumia às coisas horríveis que Hyunjin não queria ter que reviver.
— Hyunjin… — Felix murmurou ao ver o estado deplorável do outro.
Com as palavras de Olivia perfurando sua mente, Yongbok se rendeu a um pensamento intrusivo e avançou na direção do moreno, o puxando fortemente contra seu corpo e o tomando em um abraço apertado. A sensação de um abraço era algo que Felix havia raramente sentido.
Sentiu a cabeça de Hyunjin tombar em seu ombro, deixando que as lágrimas escapassem com ainda mais intensidade, apertando seus braços ao redor de Felix. Deixou fluir tudo o que estava reprimido dentro de si.
Todo o medo do que aconteceria quando voltasse, todo o receio de voltar. Estava cego em meio a todo o pânico involuntário de sua mente, não pensava em mais nada, apenas queria fugir, ignorar seu passado, queria chorar, respirar, gritar.
Precisou do aperto firme de Felix por longos minutos, entre momentos de calmaria e novas ondas de choro e desespero que o derrubaram novamente. Uma dormência percorria todo o seu corpo, e o tornava incapaz de se acalmar, com uma falta de ar que apenas piorava toda a situação.
Com um leve carinho nas costas de Hyunjin, Felix aguardou enquanto percebia a respiração do Hwang lentamente se estabilizando, e as lágrimas pararem de surgirem com tanta violência.
Havia algo muito mais profundo do que “querer uma vida tranquila” naquela reação de Hyunjin, e sabia disso. O choro, o corpo trêmulo e o rosto pálido, algum alarme havia soado dentro da mente do Hwang, mas Felix não sabia o que era, e nem como o acalmar.
E quando finalmente o choro parecia ter cessado, o loiro subiu seu carinho até o cabelo sedoso de Hyunjin, que ainda tinha a cabeça em seu ombro.
— Está tudo bem… Não precisa disso… — Tentou consolá-lo, mas era péssimo nisso. — Eu te trago aqui quando quiser.
O corpo do Hwang enrijeceu de repente, e ele se afastou do abraço de Felix, secando suas lágrimas e dando alguns passos para trás.
— Você vai embora, Felix. — Retrucou amargurado, ainda olhando para a casa.
— … Talvez eu fique por mais algumas semanas. E te trago…
Hyunjin o olhou confuso, Felix coçou a nuca com uma expressão incerta.
— Agora, sem Henry, as coisas lá em casa podem ser bem entediantes.
Hyunjin teve um breve lampejo de esperança. Talvez pudesse voltar de vez em quando e recuperar algumas de suas plantas, aproveitar o calor ameno do pôr do sol ou ver os belos dias de neve que o inverno proporcionava.
— Por que tudo é sobre tédio pra você?
— Não importa. Aqui a adrenalina é maior, então por pelo menos duas semanas eu fico. Sua paz vai ter que esperar mais um pouco.
— É você quem vai ter que me aturar por mais duas semanas — Sorriu fraco, um pouco mais aliviado.
